Ao longo dos anos muitas tecnologias foram introduzidas na indústria automobilística e no design de carros. Muitas técnicas e conceitos foram criados, mas o uso da argila para modelar e testar os protótipos, de forma artesanal, ainda é uma técnica tradicionalmente utilizada, seja para os modelos mais populares ou os luxuosos carros conceitos, exibidos no salão do automóvel. Pegue sua caneca de café e descubra porque essa técnica é tão importante até hoje.
Quem de nós não fica maravilhado com os clássicos carros exibidos nos filmes de época? Uma abundância de retas e quinas em perfeita harmonia, um charme de design. Com a evolução tecnológica os veículos foram ficando cada vez mais velozes, trazendo novas preocupações: a segurança e a estabilidade. O design de carros começou a ficar mais curvo e arredondado para reduzir o atrito com o ar e manter o veículo preso ao chão. Não é mais só um questão de estética, mas principalmente aerodinâmica.
O processo de criação de um carro pode levar quatro anos. Passando pelas fases de pesquisas com os consumidores, análise dos padrões de uso, tendências, concepção visual, prototipação, validação técnica, produção industrial na linha de montagem e finalmente, distribuição logística para a venda.
Depois de ler este artigo até o final, você nunca mais verá um carro com os mesmo olhos 🙂
Criação com foco no consumidor
Como todo processo criativo que se preze, o design de carros inicia-se pela imersão na realidade dos consumidores, para entender seus desejos de consumo e expectativas. Afinal o objetivo é criar carros que atendam as necessidades das pessoas e de personas específicas, como por exemplo, que tipo de carro uma jovem mulher, mãe, independente financeiramente e que adora tecnologia, gostaria de ter e quanto estaria disposta a pagar por ele. E se fosse um senhor, aposentado, que ao longo da vida fez um bom pé-de-meia e que adora pegar a estrada nos finais de semana?
Para conquistar estes clientes, alcançar sua satisfação e proporcionar a melhor experiência de uso possível, a indústria automobilística não brinca em serviço. Os profissionais envolvidos lançam mão de vários artifícios, como trajes e acessórios que simulam a sensação de gravidez ou as limitações de mobilidade causadas pela terceira idade, por exemplo. Isso permite avaliar a ergonomia e o conforto necessário, antes de propor o design.
Agora sim! Levando em conta todos esses estudos e o detalhamento das metas e perspectivas da montadora com o novo produto, designers e engenheiros começam a estudar as estratégias de desenvolvimento do veículo.
Hora do Design
Os primeiros conceitos começam a ganhar formas em esboços no papel, afinal é a solução mais rápida e barata para dar vida ao novo produto. Estes desenhos são aprimorados até que se chegue ao ideal, podendo evoluir para uma representação gráfica mais fiel no computador, com mais resolução e riqueza de detalhes.
Depois do projeto visual aprovado é hora de dar forma real ao veículo, e para isso é utilizada uma argila plástica sintética, conhecida como Clay. Um impressionante processo, onde o carro é modelado e esculpido por várias mãos, ganhando forma tridimensional e super realista.
Inicialmente esta escultura é criada numa escala três vezes menor que a real. Uma fase acompanhada de perto pelos engenheiros para garantir a viabilidade técnica do projeto.
Só depois de verificadas essas questões técnicas, todas as proporções e equilíbrio das formas e linhas, dá-se início a construção do modelo em tamanho real, onde a forma bruta é alcançada com o auxílio de máquinas, mas o acabamento final é um processo artesanal e minucioso, feito por verdadeiros artistas, os designers de carros.
Quando você ouve falar em argila, talvez imagine algo amarronzado, com cara de barro e com textura de pedra bruta, mas é inacreditável como um modelo finalizado se assemelha a um carro de verdade e provavelmente você nem perceberia a diferença, se estivessem lado a lado.
Para alcançar esse realismo, depois de modelar, a equipe de designers aplica um filme maleável chamado Di-NOc ou Kleenex. É uma película que imita a pintura metalizada e facilita a análise de possíveis defeitos na superfície, avaliação de volumes e efeitos de sombras e luzes. O toque final é a adição de detalhes como pneu, faróis, lanternas, etc.
Separei algumas imagens e vídeos para você ver como funciona esse processo na prática.
Modelagem em Clay: Mercedes-Benz SLS AMG Black Series
Modelagem em Clay: BMW 5 Série Gran Turismo
Mas porque argila?
Assim como eu, você deve estar se perguntando: Mas porque uma indústria tão tecnológica e inovadora como a automobilística, ainda usa a argila num processo tão artesanal, se hoje contamos com softwares especializados, monitores gigantes, impressão 3D e realidade aumentada?
A comparação é mais ou menos assim: O que é melhor para fazer um desenho, usar lápis que te possibilita apagar ou uma caneta com tinta permanente?
Enquanto a impressão 3D é apenas uma impressão estática e muito demorada por sinal, a argila permite que os designers voltem e façam mudanças rapidamente. Basta acrescentar mais massa e raspar novamente no local que deseja. Outra grande vantagem na modelagem em argila, é o ambiente colaborativo que ela cria, onde vários designers podem contribuir ao mesmo tempo. Um verdadeiro brainstorming tridimensional.
Os testes de aerodinâmica em túneis de vento é outro ponto onde a argila é fundamental, já que é muito mais fácil e rápido identificar e fazer os ajustes para garantir que a forma do carro seja a mais eficiente possível, proporcionando o melhor desempenho, estabilidade e segurança ao motorista.
Testes de aerodinâmica realizados em protótipos construídos em clay
Testes de aerodinâmica realizados em um protótipo real da Mercedes-Benz
Uma curiosidade interessante sobre a importância destes testes: durante os testes de aerodinâmica da picape Montana, foram feitos 16 ajustes nos para-choques para que as equipes definissem a peça final 😲
O uso da argila, como você pôde perceber, é tradicional até hoje e começou com Harley Earl, revolucionando o design de carros logo no começo do século 20.
Considerado uma lenda na indústria automobilística, Harley Earl foi o primeiro chefe de design da General Motors, que mais tarde se tornaria vice-presidente.
Seu trabalho provou que automóveis são muito mais que utilitários, são verdadeiras obras de artes luxuosas. Ele apresentou um design de carros com carrocerias arredondadas, numa época que os veículos eram literalmente caixas sobre rodas. Em seu portfólio está, nada mais nada menos, que o Corvette e o primeiro carro conceito de todos os tempos, o Buick Y-Job.
Mais alguns dos trabalhos realizados por Harley Earl.
Eu num sei você, mas eu eu fiquei com vontade tremenda de trabalhar com isso 🙂
Espero que tenha gostado. Me conte o que achou!