Impossível bater o olho na palavra exteligência sem associar à inteligência. O termo, que nem é tão recente, acaba sendo uma extensão do nosso entendimento sobre inteligência. Vale a pena a gente adentrar nessa reflexão para entender melhor e ampliar as nossas percepções – e claro, organizar as ideias, colocar muita coisa em prática e até ser capaz de inovar.
Nem só da própria inteligência vive o homem. E cada homem vive com a sua inteligência como se fosse o seu DNA ou a sua impressão digital. Alguns têm mais facilidade com os números, outros em contar histórias acessando uma memória incrível.
Tem gente que fala ou escreve com muita fluidez. Outros pintam, interpretam, tocam um instrumento ou criam obras incríveis, cheias de identidade. Tem gente que administra uma grande empresa sem nunca ter sentado num banco de escola.
Um dia desses a palavra exteligência me chamou a atenção. E quando parei para refletir e pesquisar, eu entendi que fazia sentido compartilhar com vocês sobre esse tema que cabe na vida pessoal e profissional de todos nós e nos ajuda a ter uma percepção muito interessante, sobretudo na era do digital. Vamos entender o porquê.
Pensando na inteligência com inteligência
Logo na infância identificamos algumas habilidades próprias. Quando os nossos pais se atentam a elas, nos ajudam a direcionar melhor as nossas escolhas na adolescência.
Algumas crianças já afirmam “o que querem ser” com categoria e seguem com aquela clareza vida afora até conquistarem seus sonhos identificados nas primeiras experiências de vida. Isso também se refere à inteligência.
A palavra inteligência vem do latim intelligentia, que é composta por dois termos: intus (“entre”) e legere (“escolher”). A origem etimológica se refere então àquele que sabe escolher e é capaz de identificar a melhor alternativa diante de uma situação.
A inteligência é algo muito individual e natural – chega para cada um como um presente da vida.
Cabe a nós dar vazão e direcionar as nossas percepções – e até intuições. Se para uns essa identificação de habilidades e competências é fácil, para outros é tarefa de uma vida inteira de descoberta.
Alguns negam, outros teimam, outros se rendem às vaidades pelo dinheiro, status ou medo e deixam de surfar no sentimento pleno de satisfação da própria essência.
Exteligência então, o que é?
Exteligência é o capital cultural disponível e que podemos acessar: um filme, um podcast, uma viagem, um livro de poesias, uma exposição de arte contemporânea, uma peça de teatro, um festival de música que participamos, uma dissertação que você lê no celular enquanto espera o Uber.
O conceito exteligência foi criado pelo matemático francês Ian Stewart e pelo biólogo inglês Jack Cohen e divulgado no livro Figments of Reality: The Evolution of the Curious Mind (Invenção da realidade: a evolução da mente curiosa) em 1997.
Os autores a definiram como um conjunto de ações e conceitos promovidos pelo conhecimento, inclusive adquirido na relação entre as pessoas nos aspectos culturais e colaborativos.
Agora vamos imaginar qual era o esforço que uma pessoa no século XVI tinha para ter acesso às informações, sendo que muitos nem eram alfabetizados?
Na Antiguidade, quando não existia a escrita, a sabedoria era passada entre as gerações pela oralidade e na prática por meio de mestres. A memória era fundamental para perpetuar a cultura de um povo.
Você tem fome de que? Você tem sede de que?
Em nossos dias, temos muitas maneiras de pesquisar e guardar as informações: na agenda do celular, post-its, no bloco de notas, na nuvem, na gravação de áudios e álbuns digitais de fotografia.
É bem provável que você não saiba de cor nem o número do telefone da sua própria mãe!
Quanto mais digital a sociedade tem se tornado, menos a gente lança mão de guardar as coisas na ‘cachola’. Sabemos onde buscar as informações que precisamos – e a internet potencializou isso demais.
Lá em casa tinha a coleção de Enciclopédias Barsa (quem se lembra?) e nas férias eu passava algumas tardes na Biblioteca Pública “Ataliba Lago” da minha cidade natal. Era um sentimento de encanto que eu tinha ao observar aquelas prateleiras gigantes de volumes e mais volumes de livros.
E hoje então, como temos acesso! Se alguém fala um termo que a gente desconhece no meio de uma reunião importante, discretamente dá pra acessar o Google e se inteirar do assunto! Ufa, que alívio! Parece mágica, já que temos saída pra tudo!
Inteligência e exteligência de mãos dadas
Juntas, a inteligência e a exteligência são parceiras em nosso processo de desenvolvimento. Ambas fazem esse movimento de convergência, que nos ajuda a fazer escolhas e conexões o tempo todo.
É um sistema que interage de forma dinâmica nos ajudando a evoluir individual e coletivamente.
Há algum tempo visitei a exposição chamada “Moderna para Sempre – Fotografia Modernista Brasileira na Coleção Itaú Cultural” no Palácio Anchieta aqui em Vitória. A coleção mostra obras de fotógrafos brasileiros, produzidas entre os anos de 1940 e 1970, quando eles puderam experimentar livremente suas composições de imagens sobrepostas, representadas numa linguagem visual inusitada.
Na época esses artistas montaram um fotoclube e trocavam informações e experiências por meio de cartas com fotógrafos do mundo todo. Era uma teia internacional de criações fotográficas modernas. Foi esse o contexto que a exposição contava.
Daí a gente percebe a necessidade que as pessoas sempre tiveram de fazer trocas e aprender com o outro. E hoje achamos engraçado pensar que alguém escrevia cartas de próprio punho e levava até os Correios, esperando pacientemente por uma resposta que poderia levar meses para chegar.
E você, de que forma tem buscado mais conhecimento nessa seara de informações?
Depois dessa reflexão, vamos à prática! É isso que a exteligência vem nos proporcionar.
Cinco dicas para você aproveitar melhor o seu processo de exteligência
1 – Ter foco. É uma força importante na construção dos processos da exteligência. Dedique energia para buscar informações verticalizadas e alinhadas com a sua intenção. Com tantos hiperlinks, abas e anúncios na internet, é fácil desviar da pesquisa principal. Começamos, por exemplo, a ler sobre física quântica, e ‘quando é fé’, estamos imersos num vídeo que nos ensina como fazer cerveja artesanal ou planejando o destino das nossas próximas férias.
2 – Pense fora da caixa da rede. A tecnologia é uma grande aliada para potencializar a nossa exteligência. Mas nem tudo se resolve baixando um app. Parece contraditório, mas hoje temos acesso às informações a um click nos canais e meios, mas deixamos de ser curiosos porque isso exige esforço. Agora a vida ficou fácil. E a internet, diferentemente do que acreditamos, delimita as informações ao universo do rastro que deixamos nela. Isso significa que acessamos informações restritas de acordo com os inteligentes algoritmos. Compreenda que é necessário ir além das telinhas (e das telonas também). Quando ficamos restritos às nossas preferências, temos a sensação de total liberdade na rede – o que é fake.
3 – Crie repertório. Esteja aberto para vivenciar diversas experiências com o coração aberto e sem preconceito. Mesmo que você “pague língua” por ter jurado que nunca perderia seu tempo assistindo a um concerto de música clássica ou a um desfile de uma escola de samba, desconstrua seus achismos e vá! As conexões mentais acontecem entre os neurônios num processo chamado sinapse e quanto mais referências reais você for capaz de construir no seu mundão, mais insights você terá no momento em que a criatividade precisa entrar em cena. E olha que ela será o grande triunfo de quem entendeu que a técnica jamais vai superar as habilidades humanas.
Vídeo Neurônios:
4 – Compartilhe o que sabe com as pessoas. Esqueça essa ideia de guardar informação estratégica na manga para você sacar na hora certa. Informação não é mais diferencial quando as pessoas têm muito acesso. Estamos na era da colaboração: quanto mais você entender que ao contribuir você recebe muito mais, potencializando sua rede cerebral e de relacionamento, não haverá miséria para mais ninguém. Somos todos um. Este é o momento de pensarmos juntos em abundância!
5 – Dedique tempo. É preciso avaliar seus aprendizados e identificar como pode usá-los a seu favor. Muitas vezes na ansiedade de buscar mais e mais e mais informações, vamos acumulando números, tópicos sobre conversas com as pessoas, dados, leitura e resumo de livros, mas depois não sabemos o que fazer com tudo isso. Que atire a primeira pedra quem nunca sentiu um desconforto com essa ansiedade. Esse tempo de avaliação ajuda você se organizar mentalmente, a criar métodos de trabalho e argumentos na hora de negociar com um cliente, por exemplo.
Exteligência inspiradora
Walter Longo é especialista em comunicação e interatividade. Ele foi Presidente da Editora Abril e conselheiro do Roberto Justus no Programa “O Aprendiz”, exibido pela Record há alguns anos. Publicou livros recentes como “Marketing e Comunicação na Era Pós Digital” (2016) e “Mulheres são digitais, homens são analógicos” (2017).
Para ele o objetivo final do processo de busca pelo conhecimento não é saber e sim ter ideias. Em suas palavras:
“Não é conhecimento, é inspiração. A busca estimula a criação de novas ideias, a epifania de soluções inovadoras”.
Com a chegada da era digital nascem novos desafios para todos nós. E a exteligência está aí para provar que é possível fazer diferentes conexões, que existem abundantemente no mundo para ajudarmos a criar novas soluções para velhos problemas.
É hora de inovar. O momento é propício demais!
A nossa sociedade é capaz de aproveitar o capital intelectual de todas as gerações da história – e somos beneficiados por isso. É preciso assumir a responsabilidade do legado que seremos capazes de deixar para o futuro.
É uma nova realidade. E quanto mais clareza nós tivermos sobre esse contexto, mais seremos capazes de apropriar dessa realidade a nosso favor. A exteligência vai te ajudar a ir mais além? Vamos nessa?